Entrevista com Padre Oswaldo Tironi sobre as missões em Angola
A família salesiana de Itajaí recebeu em 2006 o Padre Oswaldo Tironi, que passou a morar no Colégio Salesiano. Padre Oswaldo passou 17 anos em Angola, trabalhando como missionário.
Padre Oswaldo chegou em Angola no dia 30 de novembro de 1980 e retornou definitivamente para o Brasil em fevereiro de 1997. Sua intenção era apenas visitar os parentes mas por motivos de saúde não pode mais retornar para Angola.
Convidado para contar de suas experiências, Padre Oswaldo lembrou de muitas histórias e com um olhar saudoso e animado, concedeu esta entrevista.
Seu jeito tranqüilo, fala suave e olhar atento revelam a alegria de um padre salesiano que sabe que conseguiu levar o carisma e a paixão de Dom Bosco para os que mais necessitavam disso.
1. Como foi sua chegada em Angola?
Padre – Nos quatro primeiros anos de Angola o importante era ter calma e paciência. Perguntar, conversar com missionários e missionárias mais antigos para não atropelar o que já foi semeado e para reprimir com sabedoria a ânsia de querer inovar, modificar ritos, usos e costumes.
No final dos 4 primeiros anos, pedimos a Irmã Maria Luisa, angolana, que perguntasse, no final da missa dos sábados e domingos, o que o povo pensava dos missionários. Sem pressa a irmã faz essa pesquisa. Durante um jantar tocamos no assunto e ela disse que já tinha a resposta. Um grande sorriso e a resposta: o povo falou “Irmã, deixa os missionários falarem . Eles não entendem a gente mesmo. ” Anos mais tarde, um padre angolano, numa reunião sobre “inculturação” deu seu parecer: “Inculturação” é quando o missionário e a missionária falam e o povo entende.”
2. E quais suas impressões sobre o povo angolano?
Padre – Existe entre o povo angolano uma parábola que diz que Angola é assim como dois elefantes em luta, mas quem sofre é o capim. Os dois elefantes são o governo e os guerrilheiros, e o capim é o povo. Os dois elefantes um dia vão morrer, mas o capim não morre. Basta um pouco de chuva e de tempo e o capim renasce.
? um povo bom, acolhedor. Um povo unido, apesar da guerra civil. Quem une o povo é o sofrimento. O sofrimento une mais do que a religião. Há mais conversões em hospitais do que nas igrejas.
3. E como a guerra civil estava presente no dia-a-dia?
Padre – Lembro um dia numa missa da euforia de um grupo de jovens, da nossa paróquia, depois de uma chacina na capital. “Eu matei 5”, dizia um. “Eu sou mais esperto no gatilho, matei 8”, dizia outro. Outro jovem me disse certa vez: “Padre, com esta farda e com esta arma a tiracolo não vou entrar na igreja. Aprendi que não se pode matar, mas se alguém quer me matar, vou procurar matá-lo antes.” Quem somos nós para condená-lo?
O povo passa fome, morre de fome. E nós missionários(as) dificilmente passamos fome. Pode faltar-nos a comida que gostaríamos de comer, mas não nos faltava o alimento. O povo não deixa de ajudar.
Houve uma noite em que a casa onde estávamos hospedados foi assaltada três vezes, por três grupos diferentes. Passamos a madrugada toda trancados num quarto. O último grupo ainda nos soltou e nos fez carregar nossas coisas até a residência deles. Voltamos para nossa casa de madrugada, encontramos tudo revirado, e rezamos a Deus, sorrindo e agradecendo, porque mais uma vez não nos aconteceu nada, nenhum de nós foi ferido e tínhamos tudo o que precisávamos para continuar nosso trabalho de missionários.
4 – Quais os momentos inesquecíveis?
Padre: As celebrações, onde a presença da vida real deles vêm logo depois da presença de JC. Realiza-se de um modo visível a libertação. Cristo-palavra, Cristo-pão libertam de verdade um povo que já foi escravizado por 500 anos e vive rodeados de mortes e vingança.
Nos esportes, na catequese, nas festas com batuque e danças tradicionais, nas mágicas do Irmão Lopes, aos domingos, para as crianças do oratório, estava sempre presente a alegria e o carisma de Dom Bosco.
Tenho saudades…